A realidade pode ser tudo o que você quiser. Isso eu já falei pelo menos um pouco em todos os textos que publiquei nesse experimento Mozneda. Eu acredito nisso com tanta certeza, que a minha vida e a minha realidade se deslocaram o suficiente para permitir a mim observar a forma como isso acontece. Mas isso não aconteceu tudo de uma vez. Foi um processo muito aos poucos, onde passo a passo foi necessário escolher ‘desaprender’ a noção da realidade do comum-acordo. Uma das coisas mais empolgantes é desfazer-se da noção de tempo.
Todos vivemos no mundo físico, mas também fora dele. O mundo físico com seus relógios, semanas e calendários, nos força a operar em conjunto dentro de um rígido sistema de compartimentalização da vida. Ao observar os ciclos da natureza, o ser humano desenvolveu os meses do ano, e as horas do dia. A visita de Jesus ao mundo Terra marcou o inicio do calendário onde estamos hoje no ano dois mil de vinticinco, mês setembro, dia vintinove. Hoje é segunda-feira, agora mesmo são nove e três da noite. Mas isso é apenas uma das infinitas possibilidades que podem ser escolhidas. Por estarmos condicionados a um tempo linear, que apenas nos permite existir um segundo de cada vez, sete dias por semana, doze meses por ano, a noção de existir fora do tempo parece absurda ou até mesmo impossível.
O tempo é parte da experiência material. Até mesmo a luz, em toda sua velocidade, não consegue superar esse limite intencional dessa densidade existencial. Fora da matéria, quanto menos denso, menos ligado ao tempo. Isso significa que a partir de certo ponto tudo é eternidade, infinitamente, o tempo todo. Ao nascer nesse mundo, inseridos no animal humano, não temos lembrança de nada. O tempo permite o registro em primeira pessoa de uma autobiografia que algumas correntes filosóficas e acadêmicas costumam designar como o ego. Mas isso é um assunto para um outro dia.
Fora do tempo, dentro da eternidade, as coisas constantemente se influenciam. Reflita bem, já teve algum momento ruim registrado em sua lembrança retornar para lhe atormentar momentos antes de dormir? Percebe como, a sensação é similar a de como se isso estivesse acontecendo agora, novamente? E o temor do futuro, trazendo consigo a ansiedade, o medo.. . tambem acontecem como se o tal futuro estivesse aqui agora. E o agora, como é que acontece? Para a grande maioria das pessoas, o agora nada mais é do que uma porção de fragmentos de passado ou de futuro, constantemente atazanando a ideia. Mas se você reparar bem, vai perceber que tanto o passado quanto o futuro são vivenciados apenas no agora. E o agora também. São nove e dezessete da noite.
Se tudo o que existe é agora, então sempre é agora, não importa quando. Neste exato momento, a hora certa? Nove e dezoito? Não, agora é agora. A passagem do tempo é um fenômeno físico internalizado. A mente pode funcionar nesse modelo, mas também fora dele. Os filmes de ficção sobre viagem no tempo tratam esse fenômeno como algo linear, como se pudéssemos agora viajar para o passado e alterar o futuro. Uma máquina do tempo leva o protagonista ao futuro onde carros voadores, e não os robôs de bate-papo com inteligência artificial são a sensação do momento. Infelizmente, como o único presente momento possível é agora, e o tempo ser uma construção mental, uma máquina do tempo parece algo um tanto excessivo para uma tarefa tão simples. Na verdade, viajamos no tempo várias vezes ao dia, durante toda a vida.
Ao se lembrar de uma memória, ela acontece agora. Ao imaginar o futuro, ele acontece agora. Um fato curioso é que cada vez que uma lembrança é relembrada ela precisa ser recontada. Tudo o que você se lembra é levemente modificado a cada vez que você puxa algo pela memória. Tal como no filme de viagem temporal, essas leves alterações ocasionam mudanças no momento presente e até mesmo no momento presente seguinte. Você pode usar essa característica ilusória do tempo e da memória para viajar ao passado e influenciar sua vida no momento agora. Quando a lembrança ruim te atormentar, lembre-se dela um pouco diferente, quem sabe um tanto melhor. O pior momento da sua vida não aconteceu da maneira como você se lembra. De tanto relembrar, as coisas se distorcem. Ao ver como negativas as circunstâncias, elas se reescrevem cada vez piores. Você pode distorcê-las em direção outra.
Como tudo acontece somente agora, o tal passado nem existe de fato. O passado pode ser reescrito. O erro pode ser revertido. A historia pode ser mudada. Gasta-se muito dinheiro com psicologia na tentativa de cientifizar a manipulação da referência autobiográfica. Ressignificar o trauma. Buscar a aceitação do que segundo dizem é imutável. Não precisa ser assim se assim você não quiser acreditar. Quando a mente se acostuma a contar a versão mais favorável de todo momento já registrado na lembrança, a vida para de doer. Altera-se o passado e vive-se imediatamente no agora o resultado da alteração bem-sucedida.
O futuro está sempre por vir, e nunca chega. Só existe agora. Só se pode agir no agora. Só se pode escolher o que fazer, sentir, pensar no momento presente. O calendário com seus infinitos quadradinhos nos força a planejar, antecipar, esperar. Mas o único disponível para aproveitar é o de hoje. A única hora disponivel para aproveitar é a de agora. Qualquer pessoa que tentar te convencer do contrário provavelmente gosta muito de horário de verão ou está tentando te vender relógios.
Experimente a viagem no tempo. Confira os resultados agora mesmo. Agora são nove e quarenteidois da noite.